quinta-feira, 21 de abril de 2011

E POR FALAR EM " MILONGAS E MILONGUEROS"


 
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PNEUMOTÓRAX

                                             Manuel Bandeira

                                 (colaboração: Enéas Macedo)

Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos.
A vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Tosse, tosse, tosse.


Mandou chamar o médico:
— Diga trinta e três.
— Trinta e três . . . trinta e três . . . trinta e três . . .
— Respire.


...................................................................................
— O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado.
— Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
— Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.




terça-feira, 19 de abril de 2011

TANGO ITALIANO


Foto: Orietta Borgia

MEU LINDO DOMINGO

por Orietta Borgia


Às 6 da manhã o gato estava com fome, levantei para lhe dar comida, interrompendo a leitura de um lindo conto do horror, mal sabendo que o horror teria continuado ao vivo. Dei comida ao gato e voltei para a cama para continuar a minha leitura. Na terceira frase apagou a luz. Levantei para verificar se era em casa ou no prédio. Era em casa. Desliguei todos os aquecedores etc..., o Piero desceu e ligou de novo. Nessa altura meu único desejo era um café e pelo menos seis fatias de pão quentinho com manteiga e geleia. Preparei o café, botei o pão na torradeira e... ploft, a luz apagou de novo. Não tinha como duvidar de um curto-circuito em ato. Olhei pela janela, enquanto o Piero desmontava a cozinha em busca da avaria, e como estava chovendo me consolei pensando que pelo menos não iria para a casa de repouso. Engano! Fomos assim mesmo, com chuva, mãe cheia de ópium, fedor de cachorro e sem café. Botei a mãe queixosa, mas animada (a gente nunca soube se ela é pior de mau humor ou animada, não é mesmo?) dentro do carro e lá fomos nos, em busca de uma hipotética casa de repouso. Depois de mais ou menos uma hora de viagem e chuva, onde a mãe me contou quantos docinhos de natal fez e, que quis fazer logo para a Maria poder levar para a Rússia etc... Finalmente conseguimos chegar ao dito sítio. O lugar não há dúvida é bonito. Logo na entrada, um velhinho magrela em cadeira de rodas todo torto me pediu para acender o cigarro e explicou que o irmão pagava um maço por semana mas os enfermeiros roubavam o cigarro dele, mas que saindo de lá ele ia escrever uma matéria no jornal contando tudo isso, e enquanto falava babava um pouco. Depois a mocinha simpática e bem vestida nos explicou tudo, ou seja: deixa pra lá, melhor. Depois nos entregou ao animador (quarentão ou mais com complexo de jovem que adora os velhinhos), que nos levou para uma volta turística pelos quartos, academia, lavanderia etc... Mostrou fotos das mãos da Fernanda, que passou para melhor vida, mas tocava muito bem piano, e da festa de carnaval e do Papai Noel que foi levar presente aos velhinhos. Cruzamos com vários personagens, uma delas com uma dentadura novinha na mão, o animador explicou que ela não solta nunca, só na hora de comer apoia em cima da mesa, bem ao lado do prato dela. Enquanto eu chorava todas as minhas lágrimas, a mãe e o Piero comentavam as maravilhas do lugar, e quando o Piero disse que era até melhor que o colégio dele percebi porque as coisas entre nós não funcionam e jurei de pé junto que aos 65 anos nem minhas cinzas devem presenciar a catástrofe.

II Parte: O almoço

Obviamente o restaurante muito bom, no qual o Piero teve seu solitário almoço de Natal em 1970, graças a Deus estava fechado, pena, teria sido maravilhoso almoçar numa lanchonete bar tabacaria no Km 23 da Salária entre um posto de gasolina e um depósito de materiais de construção, mas não deu. A busca continuou. Achamos mais um, parecia até decente, tão decente que baixei a mãe do carro, carreguei até o restaurante, entramos, quase sentamos, mas era uma pizzaria aos pedaços, com mesinhas, e como não esperavam clientes, não tinha nada. Recarreguei a mãe no carro e finalmente chegamos num maravilhoso buraco de 1,5 m x 80 cm; O dono, desses que tratam mal os clientes, mas com muita simpatia, mandou embora um casal de namorados de 80 e passa anos (é uma perseguição, eu sei), que estavam terminando de tomar café e nos obrigou a encaixar-nos numa mesinha para anões pequenos. Obviamente tinha sobrado pouca coisa, mas tudo bem, ninguém no mundo teria conseguido me desencaixar daquela mesa e continuar a viagem. Dividi com a mãe uma grande e gorda carbonara, e quando cortei o bife dela e ela disse será que na casa de repouso vão conseguir reativar meus braços, eu respondi NÃO, agarrei o jarro do vinho e afoguei brutalmente o que restava das minhas mágoas. Na volta a mãe roncou, o Piero elogiou o restaurante e eu fiquei procurando um precipício para me atirar. Agora levei a mãe para casa, ela me informou, enquanto eu tirava os sapatos dela, que o dedão do pé esquerdo inchou, mas que passou um domingo maravilhoso. Sabe do que mais sinto falta no momento? Daquelas antigas giletes de metal, um pouco enferrujadas com as quais as pessoas podiam cortar confortavelmente os pulsos. Tente cortar com um moderno gilete descartável !!! 








domingo, 10 de abril de 2011

SENHOR QUER CRER?

                                                           ojovemcidadao.blogspot.com
                                                

(enviado por Fábio Brito)


“A gente viemos do inferno ― nós todos ― compadre meu Quelemém instrui. Duns lugares inferiores, tão monstro-medonhos, que Cristo mesmo lá só conseguiu aprofundar por um relance a graça de sua substância alumiável, em as trevas de véspera para o Terceiro Dia. Senhor quer crer? Que lá o prazer trivial de cada um é judiar dos outros, bom atormentar; e o calor e o frio mais perseguem; e, para digerir o que se come, é preciso de esforçar no meio, com fortes dores; e até respirar custa dor; e nenhum sossego não se tem. Se creio? Acho proseável. Repenso no acampo da Macaúba da Jaíba, soante que mesmo vi e assaz me contaram; e outros ― as ruindades de regra que executavam em tantos pobrezinhos arraiais: baleando, esfaqueando, estripando, fur ando os olhos, cortando orelhas e línguas, não economizando as crianças pequenas, atirando na inocência do gado, queimando pessoas ainda meio vivas, na beira de estrago de sangues... Esses não vieram do inferno? Saudações. Se vê que subiram de lá antes dos prazos, figuro que por empreitada de punir os outros, exemplação de nunca esquecer do que está reinando por debaixo. Em tanto, que muitos retombam para lá, constante que morrem... Viver é muito perigoso.”

ROSA, João Guimarães. Grande sertão: veredas. 19. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001, p.64-65.


domingo, 3 de abril de 2011

BOBAGEM... VAI PASSAR.


O bobo da corte - Foto de Marcos Arruda


BOBAGENS, BOBAGENS, BOBAGENS

 Fábio Brito

Há poucos dias, perguntaram-me por que ainda não escrevi sobre o BBB. Nossa! Já escreveram tanto sobre esse programa, pensei. Será que ainda há algo a ser dito ou escrito? Será que alguém tem vontade de escrever sobre isso a “essa altura do campeonato”? Pensando bem, se há uma “coisa” que não cessa é discussão sobre BBB e seus participantes. Mesmo cansado de tanta “falação”, topei a empreitada. Antes, porém, pensei no seguinte: o que é, para mim, o BBB? É algo deprimente, respondi para mim mesmo. Não só isso. A despeito do cansaço e do constrangimento que me causa esse assunto, ainda vou tentar encontrar algum gás para tocar em alguns pontos.
Vamos lá! Volta e meia, leio textos esbravejando contra o programa e escuto alguém discutindo a respeito da inutilidade de ‘se’ observarem pessoas confinadas em uma casa e fazendo simplesmente nada. Opa! Fazem sim! Elas são adestradas a competir usando como arma o que há de pior no ser humano. Não menos degradante é saber que muitas pessoas não desgrudam os olhos da TV quando esse programa é exibido. Acompanham tudo e “palpitam” sobre tudo. Para quê? Não sei. Estou procurando saber até hoje, desde que foi ao ar a primeira edição.
Devo confessar – para espanto de alguns amigos - que assisti ao programa durante três dias. Fiquei, sim, curioso. Sem conhecer, seria inaceitável sair por aí dando opiniões. Também não minto quando digo que não assisti – um dia sequer – a qualquer uma das edições anteriores. Além de não ter estômago (constantemente, e por bobagens, sou acometido de mal-estares), há muitos livros que ainda não li, há muitos filmes e peças de teatro a que ainda não assisti, há muitas músicas que ainda não ouvi, há muitas caminhadas que ainda não fiz, há muitos amigos que ainda não visitei, há muitas aulas que ainda não preparei, há muitas gavetas que ainda não arrumei, há muitos restaurantes a que ainda não fui. Portanto, não disponho de tempo para ficar sentado em frente a um televisor assistindo ao BBB. Aliás, meu tempo é muitíssimo precioso para ser jogado no lixo dessa forma. E a vida é muito curta, não é mesmo? Desperdiçá-la com idiotices seria um horror.   
Sei ainda que é “chover no molhado” – para usar uma expressão ‘pra’ lá de lugar-comum – ficar tecendo comentários, mesmo que mínimos, sobre a intenção da TV ao exibir programas como o BBB e tantos outros que infestam manhãs, tardes e noites de muita gente por este Brasil afora. Ninguém é tão ingênuo a ponto de não pensar na audiência e no faturamento que vem a reboque, não é mesmo? Entretanto, o que mais me interessa é saber por que esse tipo de programa dá tanto “ibope”? Por que as pessoas – e não são poucas! – gostam tanto de ver outras ‘pra’ lá e ‘pra’ cá falando bobagens (somente bobagens), querendo sexo por sexo, aprimorando a falsidade e fomentando intrigas? Por que, em vez de ficarem assistindo a esse tipo de programa, não apanham um livro? Por que não veem um filme? Por que não procuram outra programação na TV? Por que não vão dormir? Será que o grotesco atrai tanto assim?
Assistindo ao programa, fiquei pensando também nos participantes e em suas profissões. Taí um ponto pouco discutido. Vários ali trabalham (fora da casa, é lógico!) e podem ser até profissionais reconhecidos e respeitados. No entanto, alguém, por acaso, confia em um profissional que participou de um BBB? Eu não! Se é preconceito, assumo.  
Ao fim de tudo, uma perguntinha insiste: será que o BBB tem – ou terá um dia - alguma finalidade além de alimentar o “voyeurismo” de muitos? Embora algumas pessoas defendam a ideia de que esse programa é uma causa antropológica (teses e mais teses já surgiram e ainda surgirão), continuo apostando no seguinte: ali, é a escória mesmo. Aquilo é patético. É algo que me deprime e mais nada. Quer saber mais? Estou cansado de celebridades vazias. Que saudades, por exemplo, do tempo em que, nas novelas, havia mais atores e menos modelos. Devo estar fora deste mundo.